segunda-feira, 14 de março de 2011

Partilhas - Madonna House (I)

Partilhas de Madonna House

Amados irmãos, a partir de hoje trarei mais informações sobre o "Povo do Lava Pés" - Madonna House, comunidade fundada pela russa Catherine Doherty. Creio firmemente que uma das escolas mais fecundas do Germinar foi e continua sendo Madonna House. Abaixo segue a mensagem que recebi direto de Combermere, Canadá.
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Queridos amigos,

Neste natal queremos dizer que cada um de vocês estão conosco em nosso coração e em nossa oração... Rezamos por vocês e esperamos que estejam vivendo este tempo bem presentes a Deus. Em cada uma de nossas casas, em meio às ocupações da preparação para a celebração do natal, nós procuramos manter o nosso coração silencioso e pronto a acolher Jesus... E pedimos à Mãe de Deus que nos guarde na Sua paz e nos faça a todos sinal desta paz para o mundo.
Como escrevemos em nossa última “Partilhas”, no mês de Dezembro passado celebramos 25 anos da morte de nossa fundadora Catherine Doherty... Um dos costumes que ela passou para cada um de nós foi a decoração de nossas casas com burrinhos durante o tempo do advento.... Assim, durante este mês de Dezembro, muitos burrinhos passearam seja na cozinha, seja na sala de jantar, seja na sala de visita, enfim, eles estavam bem visíveis aqui e ali em Madonna House. Mas por que burrinhos? Gostamos de imaginar que foi em um burro que Nossa Senhora viajou até Belém. Ela, grávida de Jesus, e São José ao seu lado e o burrinho carregando Nossa Senhora com Jesus em Seu corpo. O burro então em sua humildade e pobreza foi o primeiro a carregar um tabernáculo pois ele carregou o corpo de Cristo no corpo de Nossa Senhora. Catarina dizia que somos todos chamados a ser como o burrinho: pobres, humildes e despojados de nós mesmos, mas conscientes de nossa dignidade pois recebemos em nós o Corpo do Senhor na Eucaristia. Assim, durante o Advento, Catarina colocava sob a sua saia uns sininhos que lembravam a ela o sino que o burro carregava no seu pescoço. Mais perto o natal estava, mais sininhos ela colocava sob a sua saia… Depois que Catarina morreu, são os diretores de nossas casas que trazem estes sininhos durante o Advento. Assim, em Madonna House, quando ouvimos estes sininhos, soa em nossos corações, o chamado de Deus para um despojamento que nos leva a tudo dar a Ele…  Neste esvaziamento se abre um lugar em cada um de nós para receber Jesus e levá-Lo aonde Ele quer nos levar. Pe. Héber Salvador de Lima escreveu “A Mulher Vestida de Sinos” sobre a Catarina, livro que foi publicado pela Loyola...

William Kurelek
Partilhando Estórias da Catarina

Eu estava no ponto de ônibus em São Paulo... Era um fim de tarde e o ponto estava formigando de gente. Eu sempre tentava evitar a hora do rush, mas neste fim de dia, lá estava eu absorvendo a fumaça, o barulho e a frustração da espera por um ônibus onde eu pudesse entrar sem ficar dependurada porta afora. Resolvi me fechar nos meus pensamentos, ainda mais que eu estava vindo da universidade e eu tinha muito a considerar sobre a minha tese e não sei quantos quilos de livros mal digeridos. De repente, a mulher que estava ao meu lado colocou um nenem recém-nascido nos meus braços. Sua voz sumida como que sussurrou: “não aguento mais”. Ela me contou que ela estava vindo do hospital universitário; o nenem tinha nascido há um ou dois dias. A gente podia pressentir que toda a solidão da cidade de São Paulo pesava nos ombros desta mãe recém-nascida. A dor nos seus olhos vinha do seu corpo, mas vinha também do corte da solidão. Ela estava esperando o ônibus... Como ela conseguiria chegar até a sua casa? A fraqueza parecia tomar conta dos braços dela, seus olhos se derramavam de cansaço, todo seu corpo tremia de solidão. Eu não precisei perguntar para saber que ninguém estaria em sua casa para ajudá-la a tomar conta do nenem. Sem muito pensar dei um dinheiro a ela para o táxi e lá foi ela São Paulo adentro no carro com o seu nenem. Parece absurdo, eu só tinha carregado o nenem por uns minutos, mas meu corpo doía sentindo a falta dele… O corpinho dele junto do meu corpo tinha feito o meu coração bater mais forte e eu queria como que segurá-lo firme como se isto pudesse protegê-lo da dor. Todas as complicações de meu mundo abstrato e todas as paredes do meu mundo fechado tinham se dissolvido no calor vindo desta criança nos meus braços. Foi então que a lembrança da porta azul de Madonna House me inundou o pensamento e uma das estórias da Catarina ressoou no meu coração…

Como Dona Avareza se tornou Dona Generosidade

Se alguém tivesse tempo para olhar para a Dona Avareza, poderia detectar aqui e ali alguns traços de beleza. Seu cabelo era longo, da cor das cinzas quando o fogo as fazem incandescer com o brilho de ouro pálido. Mas, porque suas mãos estavam sempre cheias de coisas, ela não podia pentear seus cabelos muito bem. Assim, eles eram desarrumados e embaraçados, sempre cobrindo seu rosto e, muitas vezes, escondendo-o. Seus traços eram retílineos, mas desfigurados, porque movida por aquele fogo íntimo de sempre juntar mais e mais coisas, ela não tinha tempo para comer, beber ou cuidar de si mesma.

Seus olhos eram de um violeta bonito, com cílios longos e escuros. Mas poucas pessoas já tinham realmente visto seus olhos pois eles estavam sempre para baixo à procura de tesouros. Os que já olharam dentro deles nunca se lembram da sua cor, pois quando a Dona Avareza levantava seu rosto para olhar os homens, era só porque ela desejava possuir suas almas. E quem, arriscando-se a se tornar escravo de Dona Avareza, se demoraria a relembrar da cor dos olhos dela? Quando o fogo da paixão desordenada de Dona Avareza insensibilizava um coração humano, este, em troca, pensava só em posses, sempre mais posses, pelo amor da posse.

Mas um dia , o Tempo trouxe Dona Avareza para um estábulo onde uma mulher dava à luz ao seu primeiro filho na vila de Belém, na Palestina. Três reis do Oriente estavam lá ajoelhados diante da manjedoura da criança, oferecendo-lhe incenso, mirra e ouro. Dona Avareza, naturalmente, só podia ver o ouro... Tinha tanto ouro... Muitas moedas recentemente cunhadas, tão brilhantes e bonitas como só o ouro pode ser. Tão bela era esta visão para Dona Avareza que, para ver melhor, ela endireitou sua estrutura curvada. Naquele momento ela derrubou as outras coisas que segurava e estendeu suas mãos em direção daquele ouro sem vida, porém bonito.

Foi quando Maria, a mãe da criança se levantou e pegou o nenem gentilmente. Devagar, com graça, silenciosa e majestosamente ela o colocou nos braços estendidos de Dona Avareza que ficou completamente parada. Parecia até que ela tinha ficado mais alta e mais bonita. A criança tocou um pouco de seus cabelos dourados, sorriu e os puxou. E os cabelos de Dona Avareza ficaram desembaraçados e escorridos, cobrindo-a com um manto de beleza transcedente.

A criança riu e tocou os olhos de Dona Avareza. Seu olhar fixo, feio e ansioso tornou-se gentil e radiante e ela se perdeu nos olhos da criança. De repente, Dona Avareza se curvou e beijou a criança dando-se completamete à ela... Daquele dia em diante, Dona Avareza trocou seu nome e se tornou Dona Generosidade; agora ela está sempre em busca de dar e não de possuir e é hoje a serva de Dona Caridade. Sempre que Dona Generosidade encontra-se com seu passado fantasmagórico nos corações dos homens, ela o destrói, contando a história do beijo dado a uma criança.

(adaptado por Maria Cristina Coutinho da estória do mesmo título do livro “Em Parábolas” de Catherine Doherty publicado por Paulinas)

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